16 de março de 2007

Carolina

— Então, meu filho. Já vai pros 18, hein?
— Pois é, meu pai. Graças a Deus.
— Pois eu queria, na verdade, aproveitar essa ocasião pra ter uma conversa séria com você.
— Sobre o que, papai?
— Ora, meu filho, você já é um adulto, conversemos como amigos.
— Estou ouvindo.
— Olha só, você precisa tomar algumas atitudes, deixar de lado alguns hábitos de adolescente, umas bobagens ainda de criança…
— Do que você está falando, papai?
— Ora, meu filho. Pra começar, pare de me chamar de papai. Fica meio bobo, entende? Você já é um adulto.
— Ah. Tá.
— Outra coisa: você tem que comer alguém, entende? Sair dessa fase de ficar de mão dada aqui na sala, com aquela mesma menina de sempre. Se ela não está a fim de dar, vai atrás de outra, de outras, e tal…
— Mas como assim, papai? Eu amo a Carolina, nós queremos nos casar…
— Eu sei, eu sei. Mas você já está com dezoito anos na cara, meu filho. Tem que comer alguém. E essa menina… ao que parece…
— Papai! Nós vamos nos casar na igreja, estamos nos guardando um para o outro.
— Se guardando de quê? Essa, não. Meu filho, me responde uma coisa na lata.
— Claro, papai.
— Você é veado?
— O quê?
— Você ouviu muito bem. É veado ou não é?
— Claro que não, papai! Gosto da Carolina.
— Então come ela, meu filho. Ou outra, se ela não quiser liberar a… Enfim, ela nem precisa saber.
— …
— Olha, um homem de dezoito anos tem que comer mulher, entende? É a hora. Depois você acaba casando, aí vai dar muito mais trabalho pegar mulher, entende? A patroa vai ficar vigiando, perguntando… Fica tudo mais difícil.
— Deixa eu ver se entendi: você trai a mamãe?
— Pssst. Olha aí o que você diz, meu filho. Estou lhe dizendo que um homem de verdade, e eu sou um homem de verdade, come mulher a vida inteira. Entendeu ou quer que eu desenhe?
— Mas, papai…
— Olha, vamos acertar o seguinte. Carolina é um nome ruim, é uma maldição. Essa mulher não vai dar pra você nunca, mesmo depois de casar vai ter que ser só pra fazer filho, e com o lençol cobrindo. Eu conheço o tipo. Faz uma coisa: compra lá pra ela uns presentinhos, se gosta dela, leva no cinema de vez em quando, mas depois deixa ela em casa e vai atrás de mulher pra comer.
— Não estou acreditando no que estou ouvindo. Pai, e a igreja, as pessoas vão…
— Nhã! Nem… Não esquenta a cabeça com isso não. Todo o mundo sabe que homem come mulher, meu filho. Não que você precise fazer ostentação disso, só entre os amigos mais chegados. Mas, do jeito que você está, caramba, só de olhar pra sua cara dá pra ver que você ainda não comeu ninguém!
— Mas não é o certo, papai? Casar virgem!
— Deus me livre, meu filho, quem foi que te ensinou isso? Olha, faz o seguinte. Pensa direitinho sobre o assunto e toma uma decisão. Mas tem uma coisa: não vou ficar sustentando filho virgem em casa. Está na hora já de virar homem, e se não quer virar homem por bem vai virar por mal.
— Não estou entendendo, papai.
— Não me chama de papai. Você já tem dezoito anos. E é o seguinte: ou começa a comer mulher, aliás já começa tarde, ou vai trabalhar pra se sustentar.
— Não pensei que você fosse colocar a coisa nesses termos.
— Pois coloco. Filho meu tem de honrar a família. E a comida que eu ponho no seu prato. Olha, meu filho, pense bem. Ninguém precisa saber, se não quiser não termina com a tal da carola não. Mas aproveita esse seu aniversário, sai na rua, senta com uns amigos… E dá um jeito de me comer uma mulher até, sei lá, segunda ou terça, ok? Se não, rua.
— Não sei o que dizer…
— Não diga nada, meu filho. Pense no assunto. De preferência com umas revistas mais interessantes, que eu deixei no seu banheiro. E mãos à obra. É melhor pra você, meu filho. Você vai ver. Depois que começa não quer mais parar. Entendeu? É só começar. Este vai ser um grande ano para você.
— É, papai. Talvez você esteja certo. Depois de começar não dá pra parar…
— Sim, eu estou certo, meu filho. E para com esse negócio de papai, você já tem dezoito anos. Agora vai pensar no que a gente conversou. Ou prefere já ir direto pro que interessa?
— Er… acho que ainda não. Vou subir um pouco e pensar sobre isso tudo.
— Vai, então, meu filho. Você não vai se arrepender. Ah, e tem outra coisa.
— O quê?
— A partir de agora, pode pegar o carro à noite. Só não me vai estragar a pintura, hein?
— Ah, tá. Boa noite, papai.
— Boa noite, meu filho. E feliz aniversário!
Luis

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